O Escândalo da Graça no Primeiro Natal

Apesar de viver em Portugal há dois anos, sempre me refiro a Missional como “minha” Igreja no Brasil. Porque de fato isso é uma realidade que está firmada para além dos acordos institucionais, mas nos laços fraternos de fé que aqui deixei e que pra mim continuam fortes e vivos. Conheço a tradição dessa comunidade de fé e posso dizer que essa é uma igreja que assume a tradição natalina e celebra de forma intensa esse momento. É sabido que de certa forma esse momento une a cristandade em torno do nome de Jesus, mesmo sabendo que muito dessa tradição disputa com o puro consumismo e, no momento atual, até aviltam a retirada de Cristo do centro da comemoração. Ainda assim, reformadamente teimosos, assumimos uma postura histórica de celebrar o nascimento de nosso Salvador e Redentor. Gostaria de meditar sobre o primeiro Natal, mas chamando atenção para o escândalo que esse evento causou, pelo menos naquele momento. Vejamos:

Primeiramente temos uma situação na cultura religiosa hebraica bem complicada: uma adolescente virgem, ainda não “conhecida” por seu esposo, apresenta-se a ele e se diz grávida. Com todo certeza José precisaria de uma revelação do Alto para ter seu coração apaziguado mediante a essa situação. Consegue imaginar? Consegue colocar-se no lugar de José? Ora, José ainda poderia ter entregado-a de volta à sua família, e segundo a tradição levítica, a pequena jovem poderia ser apedrejada em frente a casa de seus pais. O fato de José aceitar a história de sua jovem esposa, poderia tê-lo colocado em “maus lençóis” perante aquela sociedade. Entretanto, ele assume a jovem como esposa e com isso assume toda a provável “desonra” da situação. Sua família poderia rejeitá-lo, inclusive persegui-lo. Mas aquele marceneiro de meia idade, instado pelo espirito de Javé, se envolve então em um escândalo de fé. Um plano gerado na eternidade e que agora era apresentado à Historia da humanidade. José abraça seu chamado existencial de ser o “pai”, pelo menos juridicamente, do pequeno Jesus, filho da jovem Maria. Somente um toque da graça maravilhosa e escandalosa de Deus é capaz de mudar o coração de um homem, já com experiência de vida e provado nos trabalhos ao ponto de levá-lo a colaborar com a trama de amor desenhada pelo criador, e agora Pai do salvador.

Escandaloso foi a escolha do local onde nasceria o Menino Deus. Isso pode ser facilmente tratado como um “escárnio” se comparado às pompas do nascimento de qualquer filho de chefe tribal da época. Então quer dizer que o Salvador do mundo, filho do Deus altíssimo, Javé, nasceria em um coucho? Em meio a animais? Lugar fétido e sem higiene? Sim, foi nesse lugar pouco provável que nosso Redentor encarnou e assumiu forma de homem. Isso já demonstrava que sua vida seria marcada por contradições: Homem seus; Rei-Servo; Santo que assume o pecado de todos; Confrontador das normas religiosas e obediente à lei mosaica. Foi perseguido ainda no ventre de sua mãe quando experimentou a sua primeira fuga. O profeta messiânico registrou que “Emanuel” seria um homem de dores, e que sua aparência não atraia nenhum olhar pra si.

Por fim, o que mais me impressiona, foi a adoração dada ao menino Deus pelos Sábios do Oriente. Ora, fica evidente que eles não eram hebreus e professavam outra fé. A experiência de encontrar o Cristo veio através de uma revelação astrológica, previamente conhecida daqueles homens. Nada podia ser mais marginal, ou seja aquilo que corre à margem, do que o Messias do povo judeu ser adorado e reconhecido como tal por um outro povo, de outra religião!

Naquela noite agitada em Belém, onde muitos afluíram para responder ao chamado ao recenseamento, nascia o Cristo tão esperado nas Escrituras, e ao mesmo tempo escondido no anonimato daquele ato improvável: Deus nascia homem, em meio a animais, em um estábulo, e fôra adorado inicialmente por um povo, que não o judeu. O escândalo era completo! Mas foi em meio a esse ato escandaloso que a graça implacável de Deus perpetuou pra sempre na historia da humanidade, o grande milagre: O Salvador nasceu entre nós. Aleluia!

Que nesse Natal nossos corações fiquem atentos ao mover não religioso do Espírito de Deus, que se move e alcança quem quer, onde quer e como quer!

Rev. Gerson Freire

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