Em uma sociedade individualista e egoísta como a que vivemos somos ensinados e doutrinados desde muito pequenos a buscar nossos “direitos”, e não deixar passar nenhuma situação que nos pareça de prejuízo ou desvantagem ilesa. Não estou dizendo que não tenhamos de fato direitos garantidos legalmente, também não estou dizendo que a justiça não seja algo importante, mas quando alguém erra conosco seja em uma “fechada” no trânsito, no troco ou preço errado no supermercado, furando a fila ou qualquer situação correlata somos rápidos em nos indignar e muitas vezes com bastante furor e velocidade nos colocamos em posição de juízes e sentenciadores destes que “corrompem” nossos direitos.
Na sociedade judaica se esperava de um rabino (professor) uma compreensão superior da lei e dos costumes, e, portanto, em muitas ocasiões eram estes que instruíam e auxiliavam o povo nas resoluções de conflitos fazendo o que seria correlato a um conciliador ou juiz e primeira instância dos dias atuais. Seriam estes os primeiros que procuraríamos em uma das situações de resolução de conflitos citadas. A primeira vista pode parecer que em uma sociedade mais fechada em seu próprio ciclo isto funcionaria muito bem, mas não precisamos ir muito fundo em nosso pensamento para saber que a corrupção humana ainda que transvestida de religiosidade e santidade seria exposta em decisões mais favoráveis a estes que tomavam a posição de juízes e também aos seus amigos e afetos fazendo com que o mesmo problema que nos transforma em mau juízes também contaminasse o julgamento destes rabinos na cultura judaica, e o problema meus amigos é a injustiça (Mateus 5.20).
Certa ocasião Jesus estava falando à multidão quando alguém da multidão lhe disse: “Mestre, dize a meu irmão que divida a herança comigo” (Lucas 12.13). A resposta de Jesus certamente foi estranha para quem fez a pergunta e também causou estranheza em seus discípulos, porque como de costume um rabino poderia sim resolver ou encaminhar a resolução destas questões ainda mais sendo este rabino um mestre enviado por Deus e sendo ele o próprio Deus mais condições ainda ele teria de resolver a questão com justiça, mas Jesus responde: “Homem, quem me designou juiz ou árbitro entre vocês?”. Pode ser que para nós também em um primeiro momento a resposta de Jesus seja estranha, mas ao continuar a leitura do texto começamos a entender que o mestre estava tratando a questão com uma profundidade muito maior do que aquela que podia ser inferida pela pergunta deste homem. Jesus estava revelando e advertindo que o problema era o coração ganancioso que colocava no acumulo de bens o reflexo de uma vida de valor, como se o valor de alguém estivesse definido por sua quantidade de bens, e para exemplificar o que estava dizendo Ele conta uma parábola (Lucas 12.16-20) de um homem rico que planeja acumular ainda mais riquezas e que só não contava com a morte que interromperia seus planos fazendo com que todos os seus planos e bens perdessem seu valor e importância e seu trabalho fosse em vão. E Jesus explica ainda: “Assim acontece com quem guarda para si riquezas, mas não é rico para com Deus”. E a riqueza de Deus nada mais é do que a Graça dispensada sobre todos (Efésios 3.8).
E é aí que está a chave necessária para a mudança de pensamento e visão sobre o mundo e os acontecimentos de nosso dia a dia! Uma busca por justiça que tende a nos transformar em superiores em relação aos outros nada mais é do que a busca pela construção de um mentiroso currículo que nos afasta da verdade e pretende cobrir com as falhas alheias as nossas próprias mazelas, fazendo com que condenação seja dispersada ao invés da Graça bondosa, compassiva e gratuita que de antemão recebemos (1 João 4.19). Precisamos mudar nossa atitude ao nos depararmos com o erro e a aparente injustiça e fazer com que nosso proceder busque em primeiro lugar a dispersão da riqueza da Graça de Cristo que é repleta de amor incondicional, primeiro por nós e depois àqueles que nos ofendem (1 João 4.11) sabendo que nossos pecados e ofensas foram perdoados por este Amor, e sabemos em nosso íntimo que nossos pecados são grandes e que fomos muitíssimos perdoados por conta do tamanho nos nossos pecados (Lucas 7.47).
A chamada de Jesus para nós é esta: Ser como ele que não se colocou no lugar de juiz e sim de dispensador da Graça de Deus! Que o Espírito nos conceda sua presença em todos os momentos de nossa vida, moldando nossas ações e caráter.