As palavras de Jesus têm grande profundidade e alcance e nem por isso sua mensagem é complexa, pelo contrário, sua mensagem é bastante simples… e é aí que os problemas começam para nós que somos religiosos. Em muitas ocasiões Jesus informa e instrui seus discípulos com orientações simples, mas que são “esquecidas” ou “reinterpretadas” de acordo com a ocasião ou circunstâncias. Veja um exemplo: Jesus diz aos discípulos em Mateus 5 do verso 43 ao 48 uma mensagem bastante simples “Amem os seus inimigos e orem por aqueles que os perseguem…”; bastante simples, não concorda. Entretanto em um distinto e possivelmente posterior momento, estes mesmos discípulos não sendo recebidos em um povoado samaritano (inimigo judeu), chegam a Jesus e perguntam: “Senhor, queres que façamos cair fogo do céu para destruí-los? “ (Lucas 9.54). O que aconteceu entre o primeiro e o segundo momento? Pense bem! Jesus os repreende informando que eles estavam confusos espiritualmente. Poucos versos acima (Lucas 9.49-50) estes mesmos discípulos que foram ensinados a respeito do amor do julgamento e da visão do Reino de Cristo sendo instalado na terra tentam impedir um homem de expulsar demônios em nome de Jesus por não o reconhecerem como “um dos nossos”. O que será que aconteceu na cabeça dos discípulos para se confundirem tanto assim com as instruções de fácil entendimento dadas por Jesus? Talvez não seja possível determinar com exatidão o que aconteceu com os discípulos para que agissem assim, mas uma coisa é certa, o que aconteceu com eles acontece conosco em muitas situações da nossa vida. Somos nós mesmos que em nosso emaranhado religioso tentamos reinterpretar as palavras do Mestre para que elas repousem sobre uma realidade “mais confortável”, ou fácil de aceitar. Tomando como exemplo o caso dos discípulos fica muito clara a orientação que nos instrui a amar os nossos inimigos e a orar por aqueles que nos perseguem, mas quando isso é lido em nossos contextos religiosos a simples instrução de Jesus (ainda que seja de desconfortável e difícil execução), passa por um processo de ginástica hermenêutica na tentativa de suavizar a fala de Jesus para algo que seja mais confortável (ainda que a tradução desta palavra amor seja a flexão do original ágape). Leiam os evangelhos e percebam que a última coisa que os discípulos tiveram foi conforto vindo das palavras e ordenanças de Jesus. Se foi assim com eles porque estamos esperando que seja diferente conosco?!?! Toda a complexidade que colocamos sobre as falas e ordenanças de Jesus para nós não passam de vãs tentativas de trazer conforto suavizando nossa responsabilidade de agir conforme Ele mesmo nos mandou. Somos especialistas em criar camadas interpretativas para suavizar as palavras de Jesus e que foram repetidas por Paulo aos romanos quando Ele diz “Não julguem, para que vocês não sejam julgados. Pois da mesma forma que julgarem, vocês serão julgados; e a medida que usarem, também será usada para medir vocês.” (Mt 7.1-2 – Rm 2.1-4). Queremos interpretar o que é que realmente significa isso, como se tivesse algo além da simplicidade do “Não julguem”. Quando fazemos isso somos como o perito da Lei que tentando se justificar do que estava escrito “Ame ao seu próximo como si mesmo” quis encontrar na palavra próximo uma maneira de escapar daquilo que ele sabia ser o correto desde o início (Lc 10.25-37), e em resposta à essa tentativa Jesus conta a parábola do bom samaritano, e destrói completamente qualquer tentativa de suavização, relativização ou fuga daquilo que era a responsabilidade conhecida por nós e por aquele mestre da Lei. As palavras de Jesus e seus ensinamentos são SIMPLES. Observe bem que eu não disse que são fáceis! E por óbvio que também não quero com isso criar uma boa desculpa para que não façamos aquilo que nos foi ensinado por Jesus. É o próprio Jesus que subvertendo a lógica humana ama os seus inimigos (Rm 5.10), e morre por eles. É ele mesmo que não julgando o ser humano se faz julgado e condenado em nosso lugar, ou seja, tudo o que Ele nos ensina é fazer aquilo que Ele mesmo fez primeiro. Isso deve bastar para nós como fator determinante para que sejamos agentes da Graça e do Amor de Deus. Precisamos reavaliar nossa conduta de obediência aos ensinamentos de Jesus, nos despindo de nossa religiosidade interpretativa e nos apoiando no simples e desconfortável evangelho da cruz, que nos é naturalmente oposto, para que na morte de nossa natureza sejamos encontrados sendo parte da ação do próprio Espírito de Deus que transforma inimigos em herdeiros de Seu Reino. Que ao desmontar nossa teia religiosa a simplicidade do evangelho floresça em nós!
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